Como alguém que nasceu no fim dos anos 90, eu vivi a era do fascínio pelos livros de fantasia. Um dos meus livros favoritos era Percy Jackson e o Ladrão de Raios.
O que eu não imaginava é que cresceria com uma fantasia na vida real: o sonho da casa própria antes dos 30.
Mas o novo modelo de crédito imobiliário anunciado na última sexta-feira (10/10/25) parece querer transformar essa fantasia em algo real.
E, por algum motivo, isso me lembrou de Percy Jackson.
Se você acha que eu estou escrevendo em grego, aqui vai o contexto: no universo de Percy Jackson, os deuses da mitologia grega existem e se relacionam com os humanos.
Seus filhos são semideuses e precisam ir para um lugar protegido, o Acampamento Meio-Sangue, para sobreviverem.
Ali, cada um mora em chalés dedicados aos deuses e treina para se tornar herói.
Mas como isso está conectado com o novo modelo brasileiro de crédito imobiliário?
Durante as primeiras páginas da história, acompanhamos a angústia de Percy para deixar de dividir o chalé de Hermes com outros semideuses e ser designado para o seu próprio chalé.
A busca por um espaço próprio faz parte da vida nova de Percy após se descobrir semideus. E, convenhamos, muitos jovens adultos vivem uma angústia parecida: sair da casa dos pais ou deixar de dividir aluguel.
O problema é que para a maioria da classe média, esse sonho parece quase uma mitologia. Não atendem os critérios do Minha Casa, Minha Vida, ao mesmo tempo que financiar um imóvel próprio de forma tradicional parece algo muito distante e inacessível.
Se você ou o Percy tentassem financiar um imóvel hoje, provavelmente assumiriam uma dívida que consome boa parte dos seus salários pelos próximos 20 ou 30 anos.
Pois é, hoje em dia eu até entendo melhor porque desconfiavam que o Percy queria roubar o raio de Zeus…
Mas assim como o reconhecimento de Poseidon mudou o destino de Percy e o levou para um chalé próprio, o Governo Federal promete fazer o mesmo com o novo modelo de crédito imobiliário.
A proposta prevê a reestruturação do uso da poupança para ampliar a oferta de crédito a partir de 2027. Entre as mudanças, o valor máximo do imóvel financiado via Sistema Financeiro da Habitação (SFH) passará de R$1,5milhão para R$2,25 milhões.
A ideia é criar alternativas para a classe média, fortalecendo a poupança como fonte de financiamento.
Até agora, 65% dos depósitos da poupança precisavam ser aplicados pelos bancos em crédito imobiliário; 20% eram depositados compulsoriamente no Banco Central; e 15% tinham livre aplicação.
Com a nova medida, ocorrerá uma elevação gradual para que100% dos recursos provenientes dos saldos da poupança possam ser utilizados em crédito imobiliário.
A lógica é muito mais simples do que os desafios do Acampamento Meio-Sangue: quanto mais valores são depositados em poupança, mais crédito será disponibilizado para financiamento imobiliário.
Sem labirintos intermináveis ou viagens repletas de monstros.
O mercado recebeu a notícia com otimismo, mas como em Percy Jackson, existem desafios.
As instituições financeiras levantaram algumas preocupações em razão do descasamento entre o prazo habitual dos contratos de financiamento imobiliário e o período previsto para o direcionamento dos recursos.
Outro ponto de preocupação é o teto de juros de 12%, que pode limitar a oferta de recursos para o mercado imobiliário, especialmente se a taxa Selic subir.
Quer um conselho digno do Oráculo dos Delfos?
A mudança acende dois alertas: os próximos anos prometem ser um bom momento para compra de imóveis, mas é preciso estar mais atento para cláusulas contratuais ou tentativas ilegais de repactuação dos contratos vigentes.
No fim das contas, o sonho da casa própria continua sendo uma jornada.
A diferença é que, agora, talvez não seja mais preciso ser um semideus para chegar lá.
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